Postagens

Mostrando postagens de maio, 2010

Para ser melhor I

Não é por fora que se deve passar, para ser melhor. É por dentro. E dentro, é um lugar difícil de se atravessar. Armaduras não funcionam, revólveres, bombas, estiletes, gilete. Não funcionam. O que funcionaria, seria, a desarmadura total do ser que pensamos ser.

Seu silêncio me responde

Seu silêncio me responde. Se falasse, não diria nada do que gostaria de ouvir. Então, esse silêncio é, até, bom. Embora doa e me diga coisas tristes. Embora fale que meu tom não acerta com seu jeito. Na tarde, ontem, ouvi muitas coisas: entre ser e sonhar, viver é bom. Um amigo escreveu poesias tristes, pelo correio, as recebi. Mais tristes do que as que tenho escrito. Tomei chá e verifiquei que rir, é bom. Mas seu silêncio sentado ao meu lado, sorrindo assim, de jeito bem jocoso, incomodou a minha tarde boa. Na cama, antes de deitar, pedi a Deus para me levantar já sem sentir seu silêncio em mim.

DORMINDO COM UM POETA

Eu não conheço Caeiro, mas ele dormiu comigo e me fez gozar da escolha de algumas palavras. Gozei muito com a palavra sentido, que não consegue explicar. Gozei com a palavra riso: de quê? Do quê? Que é riso? Qual nada! Riso é bobagem. A vida contemporânea é “inrizível”, ele falou. Fiquei séria ouvindo aquele homem-amplidão... Pediu-me com suavidade que não pare. Não pare de crer na palavra. Pediu-me severamente para desacreditar nos homens. Fiquei pálida olhando aquela voz... Penetra nas coisas sérias e se abandone em si. Deu-me muitos conselhos e me beijou a fronte. Abraçou-me e dormimos assim. Não quero mais acordar.

PARA RAFAELA

Não tive sorte na vida de encontrar sincero amor, mas encontrei Rafaela. Que sabe de sonhos e sentimentos. Sabe de mais. Porém, no que concerne às coisas essenciais sabe até mais. Rafaela é uma figura dessas que a gente encontra numa tarde, e quer que fique até tarde da madrugada. Dessas pessoas que não passam, que não vão embora, que nunca partem de nós, de nossas vidas. Inda que a distância física exista. Um abraço enorme Rafaela! É chato e difícil não encontrá-la para me acompanhar num café, ouvir minhas sandices de poeta que não sabe escrever, nem conceituar a Poesia.rsrs SOLI

O que é Poesia Drummond?

Drummond me diz e este nariz? Este nariz belíssimo Drummond Cheirou saída para nossas investidas Idiotas em amar o perdido? Este seu nariz perfeito, Pontudo, Indicando: siga. Cheirou o amor? Não digo do amor-sexo, Amor-visgo... Amor, mesmo. Cheirou? Sentistes Drummond, Cheiro de possibilidade De avanço moral Nessa corja intelectual? Ai Drummond. O que é Poesia? Ontem um professor me perguntou... Eu queria dizer que penso que Poesia Seja algumas coisas que não sei. Queria dizer que sobre poesia, Amanhã direi... Não consegui Drummond. Sei que Poesia é imagem, Que nem todas as gentes apreendem. Pode ser que seja que poesia, Sejam comunicações. Linguagem? Uma forma de não ceder. Pode ser Drummond? O que é Poesia, Senão a alma querendo Resistir. Resistir a tudo e a nada, Resistir ao ser e não ser: Eternas melancolias. Resistir à força... Pode ser Drummond? Dizem que Poesia é arte. Pode ser. E do teu nariz, diria o mesmo. CONTINUA...

Quando dormir faz acordar (Dormi com um homem sério)

Eu não conheço Caeiro, mas ele dormiu comigo e me fez gozar da escolha de algumas palavras. Gozei muito com a palavra sentido, que não consegue explicar. Gozei com a palavra riso: de quê? Do quê? Que é riso? Qual nada! Riso é bobagem. A vida contemporânea é “inrizível”, ele falou. Fiquei séria ouvindo aquele homem-amplidão... Pediu-me com suavidade que não pare. Não pare de crer na palavra. Pediu-me, severamente, para desacreditar nos homens. Fiquei pálida olhando aquela voz... Penetra nas coisas sérias e se abandone em si. Deu-me muitos conselhos e me beijou a fronte. Abraçou-me e dormimos assim. Não quero mais acordar.

Do mundo, das gentes e de nada...

Não tem sentido este mundo Tudo o que há são interpretações Do que seria um Sentido qualquer. Estes sentidos todos Reunidos, Não daria um sentido Interessante. É tudo tão mesquinho, Tão poucamente instruído Para algo maior Menos panorâmicas. Dona Bizé tava certa: Gente não é gente comadre! Esbravejada na mesa Tomando café. Eu, ainda pequena, Achava aquilo uma tonteira. Velha mais besta (pensava) Essa dona Bizé. Fui crescendo e a visita De Dona Bizé sumiu. Morreu, acho. Não sei dia, nem ano. Minha mãe ficou repetindo A sandice de Dona Bizé De vez em quando: Gente não é gente... Que bobajada meu Deus Agora é minha mãe. Vive repetindo essa Tonteira, daquela velha abestada. A família já não era mais Aquele monte de criança no terreiro Eu crescendo Todos se afastando... Gente é assim, Afasta-se uns dos outros Quando cresce... Desleixa de amar, eu acho... Minha irmã mais querida Morreu afogada na cisterna. Comecei a sentir Dores de gente grande. Comecei a entender Que às vezes a gente sofre,
A sua mão em mim, acariciando as palavras que escreveria. Aquecendo minha inspiração. Isso é poesia? A sua mão em minha mão, depois de tudo, refazendo as forças do meu pulso, para dar certo no outro dia: isso é poesia? A sua mão levantando a página do livro, com o carinho de uma voz de mãe preocupada com o vento no pulmão do filho: isso é poesia? E se não for poesia, do que se trata?
Sempre me enfraqueço diante de ti. Tanto que o vento alcança fácil os Meus pensamentos. Tanto que se o olhar não foge: deslembro. Solineide Maria

Maria

E agora Maria vai sozinha, Porque aquele a quem pensava amar; Escafedeu-se. Ela não tem tempo para dúvidas, Nem para procurar respostas Que não mudariam O rumo dos acontecimentos. Não vai para a festa Porque os meninos não Tem com quem ficar. Nunca zombou dos outros, Pois sempre soube que Os outros e ela, São, em verdade, Uma coisa só. Todo mundo sofre, Todo mundo chora. Para que zombar? Sabe que passará um tempo sem homem... Porque mãe solteira com quatro buguelos Para alimentar, vestir e Calçar, não seduz tão fácil. A noite esfriou, mas guarda Um casaco do tempo do onça, Que é bem quentinho, embora Não seja modal. Sabe que tem um povo Que vai fugir, Medo de que ela peça Grana emprestada. Sabe que o ônibus vai atrasar, E, que às vezes, não Vai ter como pagar. Sabe que às vezes vai mofar De esquecida. Mas Maria é forte, Maria agüenta, Já agüentou tantas... Incoerente nunca foi, Intelectual não teve tempo De ser, ainda . Nunca sentiu ódio, Tem raiva de alguns, ódio não. Quando saiu de M

O desaparecimento da palavra

A palavra foi vista escondida numa meia hora qualquer. Vítima, coitada, da falta de assunto, de vida, de amor. A palavra bebida sem ânsia, sem expectativa: nem sim, nem não. A palavra, então, tomou ira de ser dita: nojo, talvez. Esqueceu-se do que significava e retornou ao mundo dos que nada dizem, nem sabem: por opção. Também, o que fazer num mundo onde as palavras não são ditas com o engajamento que se faz necessário? A palavra disse, de si para si: Não! Não servirei para o nada incompleto e sem matiz nenhum. Afastarei de mim este: cale-se. Depois sumiu e nunca mais foi dita. Solineide Maria 2009

NINGUÉM MAIS USA RELÓGIO (mais uma noite a menos para Bete)

Não quero mais sair. Nenhuma varanda tem flor de verdade, parece. Difícil achar a poesia passando... Outro dia um cara me olhou e perguntou as horas: eu não tenho relógio , respondi. Ele disse assim: hoje em dia ninguém mais tem relógio . Não é verdade, muitos ainda usam relógio, respondi, ele disse que não. Eu falei que era por causa do celular e ele acha que é por causa da pressa. As pessoas, segundo opinião sua, querem se esquecer. Não querem mais lembrar que horas são. Eu lhe disse que precisava escrever isso, parecia poesia e ri. Ele riu e disse que escrevia poesia. Eu abri um sorriso e ele me deu seu cartão com telefone e tudo o mais. Despediu-se dizendo: me liga. Eu ri. Lógico que liguei e saímos, afinal estou sozinha... Mas no dia em que saímos, ele estava com relógio e olhava para ele a todo o momento. Eu falei que ele estava menos alegre, e perguntei se era por conta das horas, ele respondeu que não. Mentira, claro. Vi logo que parecia se tratar do caso típico de homem enrol

ORAÇÃO DAS MÃES CONTEMPORÂNEAS

Mãe Teresa de Calcutá, Ensina-nos a ser mãe sem cobrar. A amamentar os filhos de outros Ainda que não tenhamos leite: Que seja leite-amor, Leite-esperança, Leite-doação-de-tempo, Leite-oração, Leite-caridade. Mãe Irmã Dulce, Ora a Deus para que sejamos Mães de perto e de longe . Aquelas que sabem onde o filho está Ainda que este não esteja Fisicamente, Pois filho não está nunca Longe do coração de uma mãe. Porque u ma mãe que se preze , Está sempre cuidando do seu filho , Mesmo há zilhões de quilômetros. Mãezinha dos filhos pobrinhos Da cidade de Salvador Pede ao Salvador, por nós Mães que se encontram Desoladas, desarmonizadas Nas maneiras de amar. Mãe Zilda que partiu recentemente Para a Pátria Espiritual, Fazei com que continuemos a caminhada De amar o filho ressequido das mulheres Pobres, nordestinas, gaúchas, paulistas Amazônicas, manauenses, marauenses, Brasilienses, macapenses, Brasileiras, bolivianas, chilenas e Haitianas. Mãe Teresinha do Menino Jesus, Inunda os corações de m

DE MÃES E PRISÕES

Um homem foi preso de madrugada na rua onde moro. As vozes pasmas, mas caladas. E a sisudez da farda pegando nele e dizendo, sem falar palavra: v ocê pegou o caminho errado meu rapaz. Chovia um pouco, e a pressa daquele momento, o vexame daquele instante, a tristeza daquilo tudo, ficou maior. Fechei a veneziana e preparei um chá. Na cozinha, burburinho de vozes chorosas, ainda ouvi. Lamentos... Também eu, lamento, mas amanhã cedo, que é hoje (afinal são três da manhã) a vida continua. Terei de sair com meu uniforme para o trabalho insosso e todos terão de preparar alguma coisa para o almoço. A vida é assim, não é? No entanto, uma mudança ocorreu no coração da mãe daquela criatura, pois vê-lo daquele jeito, mãos com algemas, cabelo molhado pelos golpes da chuva, carregado por homens fardados, não é a melhor das visões para uma mãe. Nunca será. Não quero saber o motivo daquilo. Mas amanhã é Sexta-feira Santa, isso tudo me fez lembrar outra Mãe chorosa, triste, ferida, quando da ocasião

PARA LUCCA

Se amar fosse escolher, eu amaria você. Amaria até seus defeitos, suas reclamações, por nada. Se amar fosse escolha, amaria você e suas ausências, seus silêncios, medos. Mas não é assim. É? Amor é acaso, é coisa que não se explica, mesmo que Schopenhauer tente.
Longe muito longe um moço sorri e diz coisas que não ouço. Não quero mais ouvir. Partirei urgentemente. O mundo tem outras coisas; preciso desiludir.