Perguntas difíceis...

Até que ponto o ser humano voltou?...

Antes era vergonhoso assinar o nome com a digital. 
Dona  Maria, faxineira da escola primária onde estudei, sempre se apoiava sobremaneira na mesa da Direção, para que não a víssemos assinar  seu nome assim (com o dedo embevecido na espuma para carimbos).
Um dia ela decidiu pedir ajuda à professora Djalma e, com tal apoio, tentar aprender assinar seu nome. 
Ela conseguiu...
Toda feliz alardeava o feito: "já sei assinar meu nome, não preciso melar mais meu dedão".
Hoje vi uma matéria infame (mais uma)... Certo deputado viajou para Paris e deixou um colega com a função de assinalar sua senha na Sessão de alguma votação do recinto onde faz parte...
Apurou-se depois (para ele, infelizmente) que naquele dia, o "nobre" deputado estava longe em Paris (provavelmente visitando a Torre...).
Ficou decidido então, que a nova forma de assinalar a presença naquele ambiente público (Câmara de alguma cidade deste país cheio de histórias vergonhosas tais quais esta), seria com a assinatura digital (onde o indivíduo pressiona levemente o "dedão" numa máquina especializada em leitura de digital).
Lembrei de Dona Maria e sua alegria pueril em poder assinar seu nome... 
Ela se envergonhava de ter que assinar com o dedão... 
Se estivesse viva, poderíamos discorrer sobre o assunto. Logo entenderia o grande paradoxo (em outro termo), mas entenderia sim, que chega a ser feio que uma criatura tenha que assinar digitalmente sua presença, por usar de má fé, por vilipendiar do dinheiro público (viajou por conta do nosso dinheiro).
No entanto, ele lá estava (na entrevista), com a maior cara de pau (feito todos esses políticos canalhas): com seu terno limpo e vistoso, barba depilada à cera, cabelo alinhado... 
PREFIRO DONA MARIA seu deputado calhorda! Ela e seu único vestido de sair, suas sandálias de dedo (recauchutadas com pregos pelo solado) e seu pano de cabeça amarrado com um nó mal elaborado. Ela sim era nobre! E assinava seu nome, com bastante orgulho, naqueles imensos dias de trabalho braçal, onde limpava nossas salas, reabastecia nossos filtros com água limpa, preparava o café com leite (doação das professoras da escola) e compartilhava de sua alegria desdentada. 
PREFIRO, MIL VEZES, DONA MARIA, seu deputado ladrão!

Solineide Maria


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