Uma noite com Rilke

Rilke esteve comigo na noite passada. Contou-me em voz muito educada e doce sobre a paz e a dor. Falou-me que estes sentimentos os quais damos acesso, ainda são pequenos... Mas aos poucos evoluímos, mesmo com emoções tão rústicas...
Disse que paz não é falta de luta. Disse que na vida, uma batalha boa e sofrida é remédio contra qualquer dor.
O poeta alemão me contou também, que o silêncio é a solidão que a alma necessita, para ampliar suas capacidades de lidar com o temor da falta de pão para o espírito.
Rilke me lembrou que nada é em vão. E um pouco sorridente asseverou: “da falta de ombro para chorar é que muitas vezes o nosso fica forte e chega um dia a servir de ‘píer’ para os companheiros.”
Seu olhar me consolava e, num momento em que saboreava do chá que havia lhe oferecido, acrescentou que nestes mares imensos que se fazem na vida dos que buscam a paz, a dor é companhia que engrandece.
Rilke advertiu que o ciúme e a inveja existem. Disse que são frutos do olhar doente do irmão que deseja o que alcançamos. Mas adiantou que tais experiências devem servir, unicamente, como elementos de análise, para que, tal olhar, nunca seja o nosso. E para o irmão adoecido indicou prece.
Falou ainda que todos os ciúmes e invejas e outros males, sejam mais ensinamentos do que perturbações.
O vate acrescentou que a paz e a dor estão sempre juntas. Andam de mãos dadas. Ele disse que é para que não tropecemos por vaidade. Aquele que parece inimigo traz consigo uma dose de lenitivo, que serve para as reflexões mais recônditas...
Rilke pegou minhas mãos e as uniu. Lamentou que ainda que quisesse ficar já se fazia tarde. Rogou que estude ainda mais; que leia ainda mais; que me dedique mais ainda ao ofício de escrever e à literatura.
Rememorou-me que essas coisas não se esgarçam e não se perdem na eternidade. Sorri. Beijei suas mãos de poesia e paz e dor já compreendidas.
Olhei aqueles olhos tênues e tranquilos e fiquei com a lembrança de sua voz doce, com a leveza de sua presença.
Abracei suas lições de amor e morte e paz e dor e prazer e sorte.

3 e 15 da manhã de 21/05/2010 - Solineide Maria

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