Luto pela Educação


 
Foi quando ele, um menino de 10 anos, atirou em sua professora e depois se matou.

Não. Isso não é frase de um conto policial medonho. Isso aconteceu ontem, em São Paulo. Mas poderia ter acontecido aqui na Bahia, no Rio Grande do Sul ou na China. Poderia. Porque o que se revela diariamente é uma humanidade desnorteada. Infelizmente, cada vez mais cedo isso ocorre: o desnorteio do ser.
Deparamo-nos com uma situação limite! E onde está a porta de saída? Para onde fugir? Talvez não haja saída, porque parece, o caos se instalou,  e isso pode ter ocorrido, justamente para que se apurem culpados e inocentes e, definitivamente se faça a separação do que tem e do que não tem crédito.
A Educação está de luto. Não somente em tal área a desordem impera, o que se tem apresentado no país (no Planeta) é um misto de degradação de tudo o que os humanos pensaram um dia estarem a construir. São muitos problemas, poucas soluções são apresentadas – ou nenhuma.
Recorrendo aos antigos, porque é preciso recorrer aos antigos sábios, para que se percorra um caminho possível de entendimento nesse (e em outros) assuntos, percebo minha solidão. E porque não dizer minha falência...
Há que se decretar falência enquanto seres humanos, enquanto pessoas que se dizem humanas, enquanto profissionais, vizinhas (os), amigas (os), irmãs (os). O caos se instalou. O guia, agora, parece ser o olho do furacão. O guia agora, para medir o que é mais hediondo do quê, é a próxima Manchete, a próxima notícia, a próxima catástrofe...
Volta e meia minha avó paterna dizia assim: “- Minha filha: vai chegar um tempo onde o que é certo vai parecer errado”. Olha que sábia profecia. Eu, que não entendia nada de nada, achava aquilo uma charada. Alguns diziam que ela estava gagá, porque estava com 84 anos e um câncer na garganta. Era a dor que sentia, diziam, que lhe fazia falar bobagens... Tonteiras... Qual nada. Ela estava certíssima, e morreu assim. Certíssima. Um dia dormiu e não acordou mais. Graças a Deus.
Digo assim, graças a Deus, porque creio que a morte é início de outra jornada. Mas a morte nunca deve ser premeditada. Não se deve apontar um revólver para o outro e tentar matá-lo. Pior: não se deve matar-se. A manchete é assustadora: “Menino de 10 anos atira na professora e depois se mata”. Quantos estão assim, estarrecidos até agora? Não se sabe. Porque em seguida falou-se do Rock in Rio e depois das construções atrasadas para a Copa de dois mil e não sei quanto. E depois nada...
Antes, se lutava por escolas melhores. Os estudantes se “armavam” de palavras, e saíam pelas ruas, com faixas e cartazes, ferramentas de brigar por suas causas. Muitos foram presos e tantos outros foram maltratados. Antes, o estudante clamava por escola e professor, e por material escolar e por bibliotecas. Antes, os estudantes gostavam dos Engenheiros do Hawaí e Legião Urbana (que tinham lá seus maluquinhos, mas não prejudicavam ninguém). Antes, o estudante estudava.
Hoje, as armas são a faca e o revólver (de verdade). E muitos matam professores (matam alunos também). Hoje, os presos são adolescentes (muito jovens), que abarrotam outras Instituições falidas... Hoje, músicas de cunho muito erótico entram para as salas através de celulares e net books... Hoje, a maior parte das escolas tem Biblioteca... Hoje, a rebeldia parece ser (mesmo) sem causa.
Recorro novamente aos antigos, e leio num livro amarelecido (presente de uma professora querida) um poema que até doi, de tão real: “Chega um tempo em que não se diz mais: meu Deus./ Tempo de absoluta depuração./ Tempo em que não se diz mais: meu amor./ Porque o amor resultou inútil./E os olhos não choram./E as mãos tecem apenas o rude trabalho./E o coração está seco.
Em vão mulheres batem à porta, não abrirás.
Ficaste sozinho, a luz apagou-se,
mas na sombra teus olhos resplandecem enormes.
És todo certeza, já não sabes sofrer.
E nada esperas de teus amigos.


Pouco importa venha a velhice, que é a velhice?
Teus ombros suportam o mundo
e ele não pesa mais que a mão de uma criança.
As guerras, as fomes, as discussões dentro dos edifícios
provam apenas que a vida prossegue
e nem todos se libertaram ainda.
Alguns, achando bárbaro o espetáculo
prefeririam (os delicados) morrer.
Chegou um tempo em que não adianta morrer.
Chegou um tempo que a vida é uma ordem.
A vida apenas, sem mistificação.

Percebo que estou de luto. Luto pela Educação...

Solineide Maria de Oliveira é recém-formada em Letras (Licenciatura) através de uma Universidade Pública.
Seu percurso estudantil foi todo ele, realizado em escolas públicas. Numa época em que não havia bibliotecas nas escolas, nem distribuição de livros didáticos, nem celulares e note books...
Suas artilharias eram um singelo lápis e um pueril caderno brochura (pequeno).
E a PROFESSORA compunha (junto com ela) o quadro de sua possível ascensão enquanto estudante/pessoa/gente.


Comentários

  1. É Solineide... "onde está a porta de saída?" Seu texto está perfeito. Triste... mas perfeito!

    Áurea (Belém)

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  2. Parabéns Solineide. Você conseguiu "desabafar" belamente, através do exercício da escrita.
    Também estou péssima, até agora...
    Um abraço.
    Joana Assis (Teixeira de Freitas)

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  3. Um dia, essa nossa educação melhorará! Mas não simplesmente porque temos bons professores, porque estes já existem; mas, principalmente porque teremos BONS alunos, estudantes, cheios de vontade de conhecer.

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