GUARDADORA DE MIM

Eu não quero ser poeta.
Quero saber ser sozinha.
Às vezes não. Às vezes quero estar acompanhada.
Talvez, por saber intimamente,
Que verso nenhum me salvará de mim.

Eu não quero ser poeta.
Quero andar por aí e saber dar conta de mim.
Ver o sol e apenas ver o sol.
Não quero sentir nada, além de frio e calor.
Sede, talvez.
Ser poeta é o mesmo que arder num labirinto de paz.
Eu não quero.

Quero ir para a praia e ver as nuvens,
Apenas ver as nuvens e tomar banho na água salgada
E voltar para casa.
Não quero ter o dom de ouvir silêncios.
Não quero.
Quero ser simples feito um cisco,
Uma erva que brota no meio da relva.
Feito tudo o que é simples.
Não quero saber de atalhos também,
Não quero. Não faz bem.
Quero a leveza de não ter à mão, nenhum cajado.
Não quero ser poeta e me ver recortada.

As idéias borbulhando sem teto e sem chão,
Num mundo que escorrega no abismo das mentiras.
Não quero compreender de flor e de amor,
E de tristeza e de solidão,
E de paz e de amplitude nenhuma.
Nem quero fingir que compreendo.
Não quero mais...

Eu queria você. Vê-lo tirar o chapéu e me abraçar.
Abraçar esta, que não sabe escrever resumos informativos.
Para que serve a brevidade mesmo?

Quando virás à minha porta?
Não. Não venha.
Apenas quis lhe saudar.
E dizer que não consigo mais dormir direito,
Porque a poesia me perturba
Numa janela, ou na porta,
Ou na cadeira, ou na cozinha enquanto tomo café.
E ouço umas vozes que me embaraçam,
E elas sabem ler meus pensamentos.
Sinto-me então uma folha em branco,
Pululando palavras ao crepúsculo de
Uma tarde que ainda não chegou.
Estou cansada.
Não quero mais.

Solineide Maria - final de 2008 - Para Fernando Pessoa.

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