A laje

Na laje está tudo arrumado. As mesas, duas, dessas de plástico, forradas com toalhas coloridas, muito vibrantes. As cadeiras e os bancos também estão por ali; tudo muito despojado, típico de um dia de domingo na laje. Muito calor, muita cerveja. Para os pequenos, guaraná em garrafas de dois litros e muitos copos plásticos.
Devagar chegam os convidados, metade do pessoal é da família, mas tem os amigos e os colegas de trabalho, e seus respectivos filhos. Ajeitando-se, eles sentam nas cadeiras, nos bancos, alguns ficam encostados em alguma parede esperando a carne assar.
Do outro lado o churrasqueiro arruma os espetos, vira e mexe, pinga um caldinho por cima das carnes, elas respingam na brasa, é quando se sente aquele cheiro típico de carne de churrasco em dia de domingo na laje. A fumaça acalma, e a visão da carne douradinha, saliva a boca, abre o apetite. Não dá mais para agüentar (nem mais um minuto) essa é a sensação. O desejo é pegar um tasco bem grande e tirar do espeto buliçoso com a ajuda dum garfo, cortá-la em pedaços, depois banha-la completamente com aquele molho de tomate, cebola e pimentão excessivamente suculento, em seguida abocanhar no maior gosto.
_ Abre um guaraná, pega uma cerveja! Pega duas cervejas!
_ Vai lá, chama os menino, já tem calabresa assada!
Quando a cerveja faz efeito (sobe à cabeça), o volume do som vai para o máximo, e a música baiana convida no refrão: “venha, venha, venha, venha, venha, venha...” Nisso o Rivaldo já muito “bebido”, aceita o convite da música naquele refrão sugestivo, e vai mesmo. Antes, porém, arranca a camisa num único movimento, arrasta as mesas para bem perto da parede do lado esquerdo, pois do lado direito está o microsistem novinho e arrasa em coreografia. Mexe os quadris, remexe a bunda freneticamente, abaixa e levanta numa rapidez de dar inveja. Com os braços para o alto, imita um laçador; roda os braços e grita e rodopia no chão de cimento da laje, imagine se o piso fosse de assoalho encerado...
Com aquele feito, Rivaldo consegue animar os outros convidados, que se lançam desarvorados naquele palco improvisado. O varal começa a ser arrancado, parece incomodar aos dançantes, a dona da casa acode aquela corda útil embora incômoda naquele momento para aquelas criaturas. A música sinaliza erotismo: “toma gostosa lapada na rachada, toma, toma, toma...” Chega a vez de Galega, com sua saia minúscula que consegue ofuscar a performance de Rivaldo, que diminui o ritmo de sua dança. Então Galega se espalha, dança lapada na rachada com desenvoltura, rebola até o chão, segura na cintura, solta a cintura vai contorcendo os ombros em movimentos rápidos imitando uma ginasta. Quando agacha até o chão com a mão na cabeça e a outra sensualmente perto das partes íntimas, Rivaldo não agüenta. É como se aquilo fosse um convite, e os dois lançam-se a se misturar naquela espécie de dança e apresentação teatral, como se eles tivessem ensaiado aquilo dias e noites.
A essa altura ninguém sabe das crianças, o churrasco não importa mais, embora alguém ainda vire os espetos e anuncie vez por outra:
_ Já tem coração assado, já tem calabresa!”No microsistem portátil o refrão da música anuncia: “ela é problemática, ela é problemática...ela toma conhaque, toma cachaça, quebra a cadeira”...

Solineide Maria - Dedico ao Maravilhoso Odilon Pinto.
2007

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